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quinta-feira, 10 de maio de 2012

DIVERSIFICANDO O LETRAMENTO E OS SUPORTES TEXTUAIS NO COTIDIANO ESCOLAR – A IMPORTÂNCIA DO TRABALHO COM HISTÓRIAS EM QUADRINHOS NA SALA DE AULA *

Há uma questão desafiadora hoje em nossas escolas: a apropriação por parte dos professores de metodologias e dinâmicas diversificadas no processo de aprendizagem dos alunos. Algumas vozes chegam a apregoar que, mediante a ascensão tecnológica do nosso tempo, estamos no século XXI, mas a escola continua no século passado, e alguns mais pessimistas dizem que não saímos da Idade Média. Exageros a parte, não podemos negar que muito ainda temos a avançar no cotidiano escolar para que possamos realmente desenvolver aprendizagens significativas com nossos alunos, que realmente promovam o tão almejado ‘acesso’ a todos, sem distinção, ou seja, que na construção dos saberes, os alunos desenvolvam os vários letramentos que vão abrir-lhes as portas para o mundo.

E é a partir desta questão desafiadora que o Grupo de Trabalho 7 (GT7), do “I Fórum Nacional de Pesquisadores em Arte Sequencial”, em Leopoldina, MG, propõe discutir as metodologias e práticas escolares para o desenvolvimento da aprendizagem, através do uso de quadrinhos, cinema e outras narrativas seqüenciais no cotidianos escolar e na expansão deste para outros ambientes de formação. Proponho então, entendermos a relevância do trabalho na sala de aula com Histórias em Quadrinhos.

Segundo CAGLIARI (1994)¹ , “há um constante movimento entre o sistema ideográfico e o fonográfico, na medida que aumenta a relação fonográfica diminui a relação icônica, e vice-versa”, o que não quer dizer necessariamente que trabalhar com o sistema ideográfico desprivilegia o sistema fonográfico, mas sim, que ambos se complementam e estão presentes no nosso dia a dia. Evoluímos de um sistema baseado nos significados, exclusivamente ideográfico, pictórico, correlacionado com a cultura local e que independia da língua, para um sistema baseado no significante, que pela histórica variação linguística, levou o sistema ideográfico ao alfabético, dependente dos elementos sonoros de uma língua, da ordenação linear da escrita, levando a combinação de ícones como uma escrita motivada foneticamente, ou seja, os sons de uma língua levam a um sistema de escrita. Mas por outro lado, Cagliari nos lembra ainda que variações sócio-linguísticas puxam o sistema alfabético p/ o ideográfico, sejam pelos dialetos, pelas diferentes formas de emissão fonética, ou pelos sotaques. É fato que no nosso cotidiano, convivemos constantemente com sinais, como os sinais de trânsito, com logotipos e ícones diversos, ao mesmo tempo que, para nossa devida autonomia, somos dependentes da apropriação de nosso sistema de escrita.

Falando dessa relação cotidiana e indispensável entre sistemas ideográficos e fonográficos, é importante considerar a comunicação humana através da imagem gráfica, justificando o grande sucesso das histórias em quadrinhos, representando hoje, segundo Barbosa (2006)², “no mundo inteiro, um meio de comunicação de massa de grande penetração popular”. Fazendo referência as paredes das cavernas do homem primitivo, usadas como murais comunicando “caçadas bem sucedidas, a informação da existência de animais selvagens em uma região específica, a indicação de seu paradeiro, etc.”, os autores destacam:

"De certa forma, pode-se dizer que as histórias em quadrinhos vão ao encontro das necessidades do ser humano, na medida em que utilizam fartamente um elemento de comunicação que esteve presente na história da humanidade desde os primórdios: a linguagem gráfica".

Se trouxemos da nossa própria origem a forte presença da imagem na nossa comunicação, não desmerecendo com isso o sistema fonográfico, trabalhar com quadrinhos na alfabetização e letramento, por exemplo, é sim um recurso possível e porque não dizer indispensável. Equivocadamente a escola vem privilegiando, quase que exclusivamente, a escrita do alfabeto fonético, em detrimento da imagem após a Educação Infantil. É como se existisse uma concepção que a criança tem que desenhar mais na Educação Infantil e a partir do momento que ela se apropria do sistema de escrita, o desenho já não é tão necessário. Considerando os educadores essa interpretação, as crianças vão desenhando cada vez menos, deixando latentes suas habilidades, estagnando seu ‘traço’ exatamente na fase em que elas deixaram de desenhar, ou seja, crescemos, mas nosso desenho ficou no tempo, na fase infantil.

Talvez pela própria velocidade da vida hoje em dia, pela intensidade com que vivemos nosso tempo, pela própria globalização que rompe as fronteiras e nos coloca “acessando” o mundo em tempo real, a necessidade de nos comunicarmos cada vez mais de forma ágil, resgata a vivência do sistema ideográfico, da imagem, dos símbolos. As Histórias em Quadrinhos são então, opção pertinente para o trabalho pedagógico, aliando imagem e escrita fonográfica, abrindo para possibilidades outras de letramentos, rompendo barreiras sociais, culturais, étnicas, de gênero, de idade, etc. Os HQs abrem para a diversidade, rompem fronteiras, derrubam muros, e ampliam nossas possibilidades de ler e escrever o mundo.

* Claudia Conte dos Anjos Lacerda
Pedagoga, com Especialização em Educação Inclusiva e
Mestranda em Gestão e Avaliação da Educação Pública
CAEd/UFJF
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[1] CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Linguística. São Paulo: Scipione. 1994. cap. 3. p. 114-117
[2] BARBOSA, Alexandre. Como usar as histórias em quadrinhos na sala de aula/Alexandre Barbosa, Paulo Ramos, Túlio Vilela: Angela Rama, Waldomiro Vergueiro, (orgs.) 3ed. São Paulo: Contexto, 2006. (Coleção: Como usar na sala de aula).

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